segunda-feira, abril 11, 2005

O meio segundo - 3

O sábado escaldante de sol é sempre perfeito pra tomar cerveja. De fato, no sétimo dia, quando Deus descansou, fatalmente deve ter sido um dia de sol em que ele não agüentou e sentou em um boteco onde havia um garçonzinho loiro: "Ted Boy Marino, desce mais uma!" Claro que a cerveja de Deus devia ser alguma belga, tipo a Duvel (hahaha, Deus bebendo o diabo), bem melhor que essa porcariazinha nacional aqui. Se bem que ela cumpre bem o seu papel nesse dia maravilhoso... e havia várias gostosas passando pela rua, ele estava ficando excitado. Precisava largar logo aquela mulher que não gostava dele e cair na putaria, fazer logo uma suruba, ir numa festinha "social" que nem as que ele freqëntava antigamente, com umas minas feinhas, é verdade, mas dispostas a tudo em todos os buracos. Era jovem, saudável, viril. Precisava de sexo de ocasião, e agora.

E deixara tudo isso pra ficar com ela, gostava tanto dela. Passava todas as horas que conseguia com ela e achava que a conhecia, sim, ele a conhecia a fundo, sabia quando ela estava feliz e quando ela estava triste. Tinha devoção completa por ela, a amava e dizia isso para ela 60 vezes por hora. E naquela manhã, quando ela foi se despedir dele para ir visitar os pais, sabia que algo estava estranho. Estranho não, errado. Aquele olhar se perdeu nele para produzir um sorriso amarelo. E sim, o problema era com ele. Melhor, devia ser ele. Tanta devoção, tantos presentinhos, tanta putaria deixada de lado... e engraçado que até aquela manhã ele nunca havia desconfiado dela, nunca, nem por um meio segundo. E agora só ficava imaginando se ela realmente teria ido visitar os pais, se ela não estaria rebolando em cima de algum outro cara, gemendo para outro cara. De repente ficou inseguro, tão inseguro que não conseguia se agüentar, que nem a cerveja conseguia agüentar. Vadia!

Resignado entre chorar e seguir bebendo, resolveu ficar com a Bohemia. A mesinha já impressionava, as onze garrafas de cerveja (para as quais os velhinhos que adentravam arregalavam os olhos) pareciam demais até para ele, um bebedor experiente. Sabia que não devia ter começado a beber, que quando não se está bem da cabeça sempre se bebe demais, o que no caso dele era pior, pois sempre fazia merda quando estava bêbado. De fato, as grandes merdas que fez na vida foram merdas de bêbado. Perdeu um pouco o raciocínio, pescou duas conversas das mesas vizinhas. Coincidentemente, eram sobre os dois assuntos da banca de jornal, o jogo de futebol em que ia jogar um Leão e o tal serial killer de nome engraçado, o leão, não, o playboy da cerveja, não, da morte. Playboy da cerveja era ele, completamente bêbado à 1 da tarde.

Resolveu que, estando no inferno, abraçaria o capeta. Se tinha começado a fazer merda, já não tinha motivo para terminar. Pediu a conta e tentou pagar, o dinheiro não dava, passou três cheques até acertar o valor que, bem depois, acharia absurdamente alto. Levantou, sem antes deixar de esbarrar na mesa do lado, foi cambaleando até o banheiro, mijou com a cabeça encostada na parede. Saiu então do boteco e ganhou a rua.

Era bom que a avenida Angélica fosse uma ladeira, afinal, para baixo, todo santo ajuda. Desceu três quadras e atravessou a rua na altura da avenida Higienópolis. Esquivava com manobras incríveis das madames que, ainda com seus cãezinhos, agora se apressavam para bater pernas no shopping, desdenhar das jóias das amigas, ouvir as últimas fofocas tomando cafezinho colombiano por 5 reais a xícara. Foi na direção contrária, andou até esquecer onde ia, chegou no muro do Mackenzie, lembrou, virou à esquerda novamente. Desceu a rua e logo estava no Largo do Arouche.

Ele tanto ficou pensando em putaria que resolvera realizar um de seus sonhos frustrados de infância: entrar num cinema pornô. Já fora a puteiros de todos os tipos, teatros duvidosos, casas de massagem, bares de strip-tease, mas nunca havia entrado num cinema desses. Tinha curiosidade de ver como era um negócio desses por dentro, ver se os bancos eram manchados mesmo, se os caras tiravam o pau para fora descontraidamente ou se escolhiam cantinhos escuros para se satisfazer.

(Continua em uma semana)

Um comentário:

Unknown disse...

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